sábado, 27 de agosto de 2011

Sob(re) o espaço: tempo...

Sou brasileira, brasileiríssima. Se houvesse outra oportunidade de nascer, pediria a Deus ou ao universo (ou ao responsável pela escrita de todos os fados que nos cabem - talvez um Querubim ou o Capeta, como saber?) que nascesse, novamente, brasileira. Por que? Porque não me imagino outra essência, outra linguagem, outro humor, apesar dos inúmeros lugares e pessoas que ainda hei de conhecer ou gostaria. Apesar disso, nunca fui apaixonada por futebol.
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Meu pai não gosta de futebol, estranhamente. Não sei se não gosta, mas pelo menos não demonstra paixão por time algum. Quando criança, meu primeiro "grande-amor-mirim" era (é) São Paulino, e a partir de então resolvi também sê-lo, apenas para impressioná-lo e ter mais possibilidades de assunto. Permeneci firme com essa escolha, de modo que aos 13, 14, eu realmente vestia a camisa do São Paulo (literalmente, ganhei uma oficial de meu pai em um aniversário, ainda que ele me proibisse de vesti-la em público...rs), assistia a todos os jogos via TV, rádio - aliás, acompanhar os jogos pelo rádio era o que mais gostava na época, como um fermento para a imaginação. Sofria quando meu time perdia, regozijava-me quando vencia, mas nunca, nunca mesmo, avancei para o segundo verso do hino "Salve o Tricolor paulista".
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Um dia, entendi que apesar dos amores são paulinos (...muitas pessoas fingem interesse por certos times como arma de conquista, eu sei e isso tem me preocupado...) alguma coisa em mim, meu coração?, era corinthiano. A verdade é que sempre gostei mais do Corinthians, não pelo time em si ou pelos jogadores, mas pelo mito, pela paixão que uma bandeira consegue evocar num bando de marmanjos, alguns, admito, trogloditas ao extremo, mas ainda assim, meninos que se desarmam com o ouvir da estrofe (sim, eu sei o hino todo de cor):
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"Salve o Corinthians,
O campeão dos campeões,
Eternamente dentro dos nossos corações
Salve o Corinthians de tradições e glórias mil
Tu és orgulho
Dos desportistas do Brasil"
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Então, ano passado decidi me assumir como corinthiana. Ainda não assisti a um jogo do corinthians sequer, mas estou vibrando na mesma sintonia que alguns de meus "compatriotas".
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Esse texto pretende falar da experiência tempo e espaço.
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Hoje de manhã, em meu segundo ou terceiro despertar, li uma notícia no yahoo a respeito da filha Sthéphanie do Bebeto, que recentemente fez um ensaio fotográfico sensualíssimo para uma revista, dessas que não leio. Automaticamente, recordei a Copa de 94, devia ter oito anos, recordei-me do momento mítico em que Bebeto encenou o "embala bebê", como resgatei na foto acima. Eu estava lá, torcendo pelo Brasil e emocionando-me, como qualquer um, com a homenagem que o jogador prestou ao filho com dois dias de vida. Anos depois, a criança eternizada foi convocada, segundo minhas pesquisas, para a seleção Sub-16 e a filha, dois anos mais velha, posa para a "Sexy".
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- E daí? - você me pergunta.
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"E daí" que iniciei uma reflexão inconclusiva sobre a passagem do tempo (e a saudade). Engraçado perceber como as vidas que influenciamos ou pelas quais fomos influenciados vão tomando forma e rumo diferente, mais ousados ou menos ousados que aquilo que imaginávamos, secretamente planejávamos, desconfiávamos. Nossos filhos fazendo as próprias escolhas, ora parecidas com as nossas, ora totalmente ao avesso do que somos, mas ainda assim conectadas com uma história que aconteceu num dado tempo e espaço, em que ainda éramos um. Eu que não tenho filhos substituí o laço materno pelo fraternal relembrando os amigos de São Paulo (sim, vivi 18 anos em Sampa) - entre corinthianos, santistas e são paulinos - e senti um profundo vazio que só a saudade preenche, quando não se tem escolha.
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Há sete anos mudei-me para Viçosa, a contragosto. Deixei uma série de pessoas, sonhos, vontades e dei início a minha juventude por essas bandas de cá. Não sinto falta das baladas paulistanas, porque pouco as vivi, mas sinto falta dos amigos. O azar que tenho na vida relacionamental-amorosa não me aconteceu na vida entre amigos: estes sempre foram os mesmos, desde a infância e pré adolescência, sempre foram parte de mim e do que tenho de melhor. Hoje cada um deles segue um rumo sem mim: alguns já tem filhos, outros estão casados, outros com excelentes trabalhos, perspectivas, etc, etc. A maioria deles ainda vive em São Paulo, o que mantem o meu "elo" com essa cidade ainda vivo, orgânico, apesar do meu sotaque, vícios e costumes não serem mais iguais aos deles.
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Por aqui fiz bons amigos; desses de se levar pelo tempo e espaços afora. Trabalhei durante seis anos na Pastoral da Juventude e em outros trabalhos voluntários, graduei-me em Letras pela Universidade Federal de Viçosa, vi uma série de gentes nascer, morrer, renascer; tive três relacionamentos relevantes, com pessoas muito legais, aprendi muito com a vida, desaprendi muito também, cresci em uma série de aspectos e atrofiei uma série de outros, talvez devido a comodidade em que ainda me encontro....(a de ter 25 anos e viver com meus pais). Encontrei felicidade por aqui, inventando-a algumas vezes ou sentindo-a realmente, mas o fato é que hoje inicio a minha maturidade, a mulher que serei daqui pra frente e tenho dúvidas sobre o que quero, quem sou, qual o espaço a que pertenço.
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Tenho um professor judeu que, entre idas e vindas, é uma das pessoas que mais admiro, além de referência não só acadêmica. Na última aula, uma das melhores desse mês (...em que estou deveras apática para as coisas da vida e do futuro), ele contava sobre o espírito "diáspora" que une a todos os judeus, transfigurando a noção de espaço, de pátria, de amor. A pátria pode ser também móvel, isto é, ela está mais para os valores e crenças que trazemos conosco, possibilitando assim a felicidade em qualquer meio, chão, cidade, país. Conheço pessoas de outros países que, apesar da saudade, conseguem se estabelecer muito bem aqui, o que não me impressiona, visto que o Brasil sofre de um intenso complexo de identidade e baixa auto estima, como o sujeito que sempre aprecia mais o que não é seu. Que seja. Que sejam todos bem vindos, não é esse o foco.
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Não há foco, na verdade.
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Essa semana conheci o Rio, fiz a primeira de muitas viagens que me esperam por lá; passei momentos muito bons...outros nem tanto. Cheguei segunda em casa com uma desorganização ainda pior, mais profunda, uma ligeira depressão: meu quarto (que atualmente tem as cores do Tricolor Paulista) ainda está bagunçado, a mala de viagem sobre o chão, a alma desassossegada como a de quem estava num sonho, ou pesadelo, mas que ainda dorme. Saímos, divertimos-nos, rimos, mas falta um pouco de realidade para as coisas. Estou triste, inconformada, com saudade de outros espaços, não quero mais ficar aqui, porém, só quero ir embora por mim mesma (e não por outrem) e isso exige uma convicção menos apaixonada, mais fria, a que nem sempre está.
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É mas não está. Como o amor que nem sempre é apaixonado.
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Queria ter eu o espírito semita da diáspora, como o daquele homem, mas eu ainda me conecto às pessoas de cada lugar, substituindo, assim, o meu medo do vazio.
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Mas alcanço um limite de qualquer coisa dessa vez. Cada dia dessa semana foi como um susto, um dia que se movimentou por força externa, não por mim mesma, como se chegasse a vez do meu desarranjo (ou arranjo). Quase como se nascessem asas em mim, daí a dor nas costas que me acomete há mais de mês, além de uma tosse absurda que não tem fim (tosse nervosa). Preciso fazer algumas pequenas escolhas, dentro daquilo que já escolheram por mim. Acho que é isso o que me falta agora.
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Olho neste momento o dicionário e escolho uma palavra aleatória: IMPROBIDADE "...qualidade de ímprobo; falta de probidade, desonestidade, fraude.
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Tudo bem, eu sabia que era mentira.
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Na verdade não, eu ainda acredito.
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"O teu amor é uma mentira
Que a minha vaidade quer
E o meu, poesia de cego
Você não pode ver..."
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Ainda acredito que em toda mentira há um princípio de verdade: por de trás da camisa do São Paulo, ela usava um bustiê corinthiano, mas só a melhor amiga e o primeiro namorado souberam disso.
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Bom dia!
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[ Para os curiosos de plantão, a prole bebetiana: ]

Mattheus
Sthéphanie

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