Há poucos dias, uma jovem educadora de um colégio particular foi encontrada viva, perambulando pelas ruas da cidade, vestida com uma camisa do Chapolin (camisa que ganhara da melhor amiga da épooca de dança clássica) e fumando um cigarro barato. Ao ser flagrada por uma de suas chefes, a menina joga o cigarro no chão e sorri um risinho amarelo como se dissesse: "juro que sou uma boa influência para os filhos da nação!".
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Há uma grande diferença entre "educadora" e "professora", embora ambas as denominações tragam em si certa carga de padecimento. Padecimento maternal, desses de doer estomago, rins, útero, aura e perispírito. Também há poucos dias, puxei papo com um "amor" das antigas - provavelmente o primeiro amor - que ao saber da minha atual profissão (SIM! PROFESSORA), disse-me: "Nossa, você escolheu a carreira certa! Lembro-me que desde criancinha você escrevia muito bem e era apaixonada por isso".
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Foi quando senti uma imensa vontade de chorar: é muito bom se sentir viva, mas demasiado "viva" é quase uma morte em vida. Um pouco de calmaria nos faz bem, também bem à docência; e nada melhor que a certeza do amor, amor pela causa, profissão, dom. As más línguas afirmam que todos nós o temos...um pelo menos, para garantir a ternura na ausência de pão.
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Ninguém vive só de pão; tampouco de ternura.
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Cá estamos a filosofar coisa alguma, apenas para que me lembre do essencial, mais que visível aos olhos e a qualquer outro sentido: o sujeito é para o que nasce? Mas...e aqueles que nascem para coisa alguma? Aqueles que vivem á margem, que estão sempre perdidos nesse fastidioso labirinto que é o "sempre"? Com que coração escolhemos a vida?
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Gosto muito dos meus alunos. Falo isso com uma sinceridade quase rasgada. Gosto de todos aqueles meninos, como gosto dos meus primos, na ausência de filhos. Gosto da maneira como amam, da maneira como se expressam e transitam tenuamente entre o riso e a guerra; gosto de vê-los bem vivos, como se trouxessem dentro deles um pouco daquilo que todos nós fomos. Talvez ontem, um deles me disse: "Professora, você passou o sábado todo no facebook e eu sei, porque fiz o mesmo!"; "Professora, eu odeio português"; "Professora, olha como W* é gatinho..."; "Professora...você tem namorado?"; "Professora, meus pais têm um "fogo" incrível ainda hoje...me dá vergonha!".
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Gosto de observá-los, em silêncio, e sobretudo sair do meu papel de "professora" apenas para compartilhar um pouco da ironia grosseira que cada um deles têm. Mal sabem - de meninos que são - que até o mais irritante de seus costumes me é familiar; isso porque sempre me atraiu um pouco de desvio. Eu era a menina quietinha mas que, com uma boa companhia, fazia da vida de meus educadores um inferno. De qualquer forma, nos momentos decisivos, lembrava-me de meus pais, que poderiam estar ali - desrespeitados e sem dignidade - e portanto me calava. Porque gosto do feminismo, mas a maternidade é o meu dom.
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Acontece que não me sinto capaz.
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Capaz em lhes dar aquilo que de fato merecem, não por falta de amor, mas por excesso. Tenho quase a certeza de que não nasci para a "causa": faltam-me cordas vocais, paciência, bom humor e sensibilidade. Não falta amor; mas uma configuração mais adequada. Como explicar? Vejamos duas situações que falem por si só.
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Tenho primos de seis a doze anos. Sou muito ligada a eles e eles a mim. Tenho certeza. Amo-os como se fossem filhos, mas a minha maternidade é um pouco torta, maternidade de quem não quer ser mãe, senão amiga-mãe. Lembro-me de um dia que ao brincar com um deles, ri absurdamente porque a menina de então perdera uma jogada óbvia num jogo de "pesca". Ri e incitei o riso. Quase um bullying. Tenho filmado e tudo. Para a surpresa de quem me lê, a menina não se sentiu humilhada, de forma alguma; reparou com sua inocência que eu me colocava em seu lugar, como se também tivesse seis anos.
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Já tive um cunhado-criança. Ele tinha sete. Quando jogávamos cartas, enquanto todos lhe protegiam no momento de trapaça, eu deixava de jogar, dizendo: "Olha, você está escondendo as cartas, isso não vale". Recomeçávamos o jogo, então, eu-criança-ele-adulto. Porque é assim que fui amada quando nasci, e assim aprendi a ser amor. Não carrego criança no colo, prefiro me abaixar para vê-las de perto, como os índios também preferem.
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Todas as minhas manhãs são bem-vivas. Estou quase sempre fora de mim, em um papel muitas vezes desagradável. Não sei mais - como um amante desiludido - se é isto o que sou, se quero esta vida para o "SEMPRE".
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Não é falta de amor, senão falta de configuração. O meu amor é, mas não está. Gosto dos corredores, dos olhares, das vidas, não da sala de aula. Será uma crise de iniciante? Será o fim?
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Não há didática alguma "ensinável" nas universidades. Que me perdoem os professores de didática, alguns deles, inclusive, me são bem caros. Sempre fui uma estudante "paulofreiriana", e no entanto, a primeira da minha "turma" a pedir ARREGO.
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Estou pedindo arrego!
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Aí me falam sobre o ensino médio, ou ainda sobre a vida acadêmica. Quero trabalhar no ensino médio; se possível, com jovens carentes, tenho a vontade de ser útil...Coisa de ex bailarina que vive sempre à mercê do ego. Queria mesmo a vida acadêmica.
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Qual idéia faço da vida acadêmica?
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Conviver com pessoas adultas, que sabem o que querem (ou não); estudar as coisas que mais gosto e ter tempo para dedicar-me por completo. Escrever sobre o que gosto, sem a culpa de estar perdendo tempo ou de optar - angustiadamente - por uma vida esquizofrênica. E sim: ganhar mais e ter acesso a um universo de coisas e coisas e coisas tais.
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Por outro lado, sinto-me uma mercenária. Sinto que não poderia suportar as pressões e a briga de "egos" desse meio. Sobretudo, agora como mestranda, vejo quão difícil é, para alguém do meu temperamento - enquadrar-se numa disciplina de estudos que não tenho. Há três meses sou uma mestranda sem artigo publicado, entre outras coisas que também me geram frustração.
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Ás vezes me surgem algumas ideias. Como uma pós em ensino de Língua Portuguesa para estrangeiros, ideia que me ocorreu depois de uma dessas viagens que nos abrem janelas e talvez portas. Porque gosto da minha língua, do meu país, da minha cultura, com o mesmo amor que gosto de outras línguas, outros países e outras culturas. Tenho em mim uma vontade de troca...Nunca tive vontade, por exemplo, de trabalhar como professora de uma língua que não é a minha, porém não por vaidade, e sim por destino. Já a literatura é tão universal que, se tudo vai bem, quero um dia estudar a literatura de primos, irmãos, gentes pelo globo afora. E quem sabe, dizer algo sobre a literatura da língua de CÁ.
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Mas sabe...todas essas coisas são hipóteses, e o sentido de tudo é a mesma pergunta "iconoclasta" e particular: Deveria nascer de novo? Sou incapaz da felicidade? Dinheiro traz felicidade? Como ganhar dinheiro sendo feliz?
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Sempre gostei de escrever, mas há tanto não escrevo....o que me leva a imaginar que o problema é mais curto, talvez desequilíbrio meu, interior. Por onde começar?
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O bom da vida é a experiência que ganhamos. Nunca soube o que queria da vida; somente o que não queria. Sou o tipo de pessoa que começa tudo pelo fim e escolhe sempre o lado contrário. Talvez isso me seja felicidade.
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Enquanto isso, professores universitários fazem greve. Todos precisamos de greve - de vez em quando - exceto aquele meu amigo, o qual invejo e admiro, que poderia fazer o mestrado mais exigente do mundo, mas optou - POR AMOR - pelo ensino fundamental e médio.
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E meu eu lírico vaga por aí, sem rumo e sem marca.
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"Quem poderá nos defender....
.....eu?"
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