domingo, 24 de abril de 2011

PÁSCOA

*...Borboleta... Foto de Renato Rabe.
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Páscoa significa passagem. Para os judeus, o pessah se deu quando o povo de Israel foi libertado do poder opressor; para os cristãos, quando Cristo ressuscita ao terceiro dia, isto é, transfigura a morte em vida plena. Não sei muito bem explicar a "coincidência" da data, o porquê da páscoa cristã ser comemorada no mesmo dia da páscoa judaica; sei que muitos textos do Novo Testamento foram preenchidos com o que já estava no Antigo, a fim de dar maior coesão à "História da Salvação", de modo a legitimar o Cristo como messias, anunciado nas sagradas escrituras desde o início dos tempos.
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Bem...isso pode ficar para outra ocasião.
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Meu pai me dá ovos de páscoa anualmente. Sei que é um artifício meramente capitalista, externo e que muitas vezes se sobrepõe à beleza do rito, convertendo todo encantamento da data em algo comercializado. Infelizmente, vive-se num tempo em que fazer da religiosidade alheia mote de comércio não é novidade e tampouco raro; isso pode ser percebido a todo instante, basta ligarmos as nossas tv´s em certos canais que tratam dos tais assuntos de fé....ou ainda, irmos às prateleiras de um supermercado ou um shopping... Portanto, o ovo de páscoa chega a ser inofensivo, perto de tantas outras aberrações que vemos por aí.
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O coelhinho. Não sei de onde surgiu a idéia de coelho. Lembro-me que na catequese (a "escola" de religião, para quem não sabe, onde se prepara o sujeito para a primeira comunhão e adesão ao catolicismo, geralmente quando criança) nossa "tia" disse que o formato do ovo de páscoa foi inventado a fim de imitar o aspecto da gruta onde guardara-se e velara-se o corpo de Cristo. Como nós sabemos disso? - ah! Não me pergunte! No colégio, essa tese foi reafirmada pela professora que ainda acrescentou a questão do coelho, visto que ele é o animal que reproduz com maior agilidade, isto é, dá mais ovinhos segundo a escala hora/produção... (não sei bem como isso nos foi explicado, tínhamos sete anos!).
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E as galinhas? - pergunto. Acho que no Brasil, as galinhas deviam ser o simbolo da Páscoa. Quase todo brasileiro já teve uma galinha em casa, nos seus prosaicos quintaizinhos, sítios ou belíssimas fazendas - digo isso pensando no lugar onde moro, a Zona da Mata mineira. Ainda ontem, após o jantar, meu pai pediu que não jogássemos fora o restante de comida a fim de o darmos para a galinha do vizinho (o animal galinha, ok?) que invade o nosso quintal diariamente, à noite... (o animal galinha, ok?). Nós também já tivemos algumas galinhas no sítio do meu pai, mas elas foram roubadas ou fugiram por vontade própria, o que acho mais provável, já que a vida de uma galinha (o animal galinha, ok?) não deve ser fácil.... Eu, se fosse uma ave, haveria de querer voar a todo custo. Sem contar essa coisa de "cloaca"....
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Pois bem. Meu pai me dá ovos de Páscoa anualmente. Costumava escondê-los no porão que ficava próximo à garagem de nossa casa em São Paulo. A verdade é que ele o comprava com antecedência, mas eu, sempre ansiosa e curiosa, gostava de achá-lo e comê-lo antes que o ovo me fosse dado. Por fim, com passar dos anos, isso se tornou uma tradição por aqui; ele esconde o ovo, e eu o encontro apenas para tirar-lhe o prazer da surpresa, reafirmando a minha perspicácia ante o desconhecido... Na escola, vestíamos-nos de coelhinho e procurávamos os ovinhos trajados como tal. Sempre havia um ovo para cada criança, o que tornava a tarefa um pouco chata, visto que o interessante seria a competição....
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Que coisa mais capitalista, Sofia! - diz o leitor. Estou brincando!! Sempre fui a última criança a encontrar o ovo, devido a meu astigmatismo congênito, logo...
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Tudo isso pra dizer que a Páscoa é a minha data litúrgica favorita. Não só pelo memorial que ela reinventa, ou pelo inocentíssimo ovo - que não dispenso - mas sobretudo pela mística da ressureição. Para mim, como cristã - ou mesmo se fosse ateísta, atéia, ateu - o enigma da ressurreição do Cristo é experimentado cotidianamente por todos os homens e mulheres do mundo.
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Pouco importa se Cristo ressuscitou em carne e osso; ou até mesmo se ressuscitou, se existiu. Quando criança, lembro-me de passar horas a fio imaginando como seria a recomposição do corpo físico já destruído pelas bactérias e outras formas de vida. Não é isso o que nos importa, por fim.
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O que me surpreende, o que se faz de fato um memorial da passagem do pranto para o alívio, da escravidão para a liberdade, da morte para a vida, da ausência para o júbilo, é a capacidade inata que nós temos de superar a dor e ressuscitar - em vida - tantas vezes quanto necessárias.
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Esse é o legítimo pessah.
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Tenho uma família amiga em São Paulo que, de ressurreição em ressurreição, conseguiu construir a casa própria no que antes era um barraco por onde perambulavam ratos em meio às crianças quando dormiam. Com passar dos anos, o que antes era um corredor ínfimo que nos conduzia para dentro da "casa", sobre o córrego que cheirava excessivamente mal, tornou-se uma bela recepção, onde brincam os cachorrinhos da família junto das crianças mais novas, aliás, crianças que hoje são quase mulheres - pois já se passara muito tempo. O menino mais velho hoje trabalha, paga as contas da casa, tem o sonho de fazer uma faculdade. Sai pra dançar todos os finais de semana e gosta de passar horas na internet. Sua irmã mais nova quer ser psicóloga; gosta de estudar e passear no shopping com as irmãs menores.
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Há também uma mulher que conheço. Perdera o único filho e tempos depois passou por um divórcio traumático. Ressuscitou. Ainda no ano passado, descobriu um tumor no cérebro, obrigando-a a fazer duas cirurgias de risco, uma no cérebro, outra na coluna. Ressuscitou. Diariamente, esta mulher cuida da casa sozinha, varre seu extenso "terreiro" sozinha e trabalha como enfermeira - auxiliando no ressuscitar de outras mães que perdem seus filhos.
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Quantas pessoas conhecemos cuja capacidade de ressurreição é praticamente um milagre? Quantas pessoas conseguem, apesar do medo, converter a mais obscura morte em vida?
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A celebração da Páscoa é o memorial de tantas Karine´s, Rafael´s, Milena´s, Mariana´s, Larissa´s e Laryssa´s, Bianca´s, Luiza´s, Gessica´s, Samira´s, Wellington´s que já venceram a morte física; mas, sobretudo, é a celebração daqueles que resistem - seus pais - cuja passagem, da morte para a vida, será mais penosa, porém, ainda mais mística e sagrada.
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Feliz Páscoa!
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OBSERVAÇÃO...(comentário de um leitor): o coelho, ou melhor, a lebre, veio de um ritual pagão em homenagem à deusa anglo-saxã Ostera, deusa da primavera e da fertilidade. Também tinha ovos no meio do ritual. [...] a igreja catolica se apropriou do negocio e relacionou com a Páscoa judaico-cristã. ...

5 comentários:

  1. o coelho, ou melhor, a lebre, veio de um ritual pagão em homenagem à deusa anglo-saxã Ostera, deusa da primavera e da fertilidade. Também tinha ovos no meio do ritual. Como é de praxe, a igreja catolica se apropriou do negocio e relacionou com a Páscoa judaico-cristã. e como assim não importa se Jesus ressuscitou? herege!! :P

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  2. Massa....vou publicar o seu comentário pra o povo saber entao...
    Quanto ao herege...rs...o que quis dizer é que por de tras do simbolo há pra mim o sentido mais profundo....a gente perde tempo tentando explicar uma coisa que na verdade nao é o que faz a diferença (pra minha fé), bju.

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  3. Só queria saber em qual documento se encontra a apropriação do "ovo" pelo catolicismo. Mera propaganda capitalista, nada além disso. Não precisa ir muito longe, há 1 século, comemorava-se a Páscoa com ovos de chocolate? Que comentário sem noção.

    Se a ressurreição é mero "símbolo", então, a fé cristã é vazia, e desprovida de sentido. Aliás, todo o cristianismo se baseia no nada, pois a cerna da fé cristã é justamente a vitória de Cristo sobre a morte.

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. Olá Mauro, obrigada pelo comentário.

    Bem, à respeito do ovo, não tenho conhecimento suficiente... mas sei que a prática de se presentear com ovos é antiga, há mais de século, embora esses ovos não fossem de chocolates, mas sim pintados à mão e geralmente estivessem ligados á chegada da primavera no Leste Europeu, por exemplo.

    Sobre a deusa Ostera, citada por minha amiga, eu não tinha conhecimento...porém, é fato que a cultura ocidental, e em consequencia a Igreja Romana, se apropria das manifestações pagãs (veja a data do Natal, por exemplo...o carnaval...) e não vejo isso com maus olhos, mas como uma forma de atingir um maior número de adeptos...uma coisa cultural mesmo....

    sobre o chocolate...bem, isso é comércio, mas não deixa de ser bom, não é?

    Sobre a ressureição.

    Esse Blog tem um caráter ecumênico, visa um público ecumênico. Eu sou cristã e pra mim a ressurreição do Cristo tem um grande valor, o qual não entrarei no mérito da questão. Mas, para muitos, não passa de um simbolo, uma metáfora...(e isso tem um grande valor).

    O que nos agregra, porém, católicos, evangélicos, espíritas, umbandistas e ateus, o que é universal e portanto mais importante , a meu ver, é a ressurreição daqueles que sofrem, daqueles que perdem a vida diariamente....independente da crença.

    Gosto de visar nos meus textos, ainda que através da irônia, elementos de unidade, coisas que aproximem o que é diferente, ao invés de supervalorizar o divergente....

    Por que no fim das contas...Quem de nós está certo? O que é certo o que é errado? A Torah? A Bíblia Cristã? O Alcorão?

    Um Beijo!

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