"I've been so many places in my life and time I've sung a lot of songs, I've made some bad rhyme I've acted out my life in stages With ten thousand people watching But we're alone now and I'm singing this song for you I know your image of me is what I hope to be I've treated you unkindly but can't you see There's no one more important to me So darlin', won't you please see through me? Cause we're alone now and I'm singing this song for you..." (A song for you)
"He left no time to regret Kept his dick wet with his same old safe bet Me and my head high And my tears dry, get on without my guy You went back to what you knew So far removed from all that we went through And I tread a troubled track My odds are stacked, I'll go back to black....." (Back to Black)
Experimentava séries de sonhos premonitórios através dos quais tentavam lhe entregar a chave da vida. Mas sempre, um pequeno ruído inesperado fazia com que acordasse antes da hora devida: minúsculo-mosquito, desses que incomodam a todos os lares a fim de nos torrar a paciência e espírito, criaturas divinas mas sem serventia alguma, a não ser pela ótica da cadeia alimentar, mas pouco importavam ao homem as pesquisas na área da Biologia, o que pretendia, somente, era o encontro com a chave que traria para si as respostas que lhe segredavam em seus sonhos e que fazia força em interpretá-las durante sua vigília.
A vida já não respondia, os telefones ficaram mudos, a energia elétrica e água cortadas, assim como as cartas que enviava semanalmente mas já não obtinha respostas. Sofria de sonambulismo crônico.
Acordou com o olho esquerdo vermelho; coçava-o freneticamente como se esfregasse uma lâmpada mágica na qual habitasse um gênio misterioso. Chamavam-no de louco por acreditar que vivia em duas ou três dimensões, além da terrena, a que com ele compartilhamos.
Há tempos não se alimentava. Ou melhor, alimentava-se de livros e histórias improváveis como forma de fortalecer seu grão de esperança da qual não abria mão: era um homem teimoso, certamente ariano com ascendente em touro.
Havia demasiado trabalho a fazer, porém escolhera a solidão. Era no solstício da cegueira que encontrava seu quinhão de paz, incomunicável e incompreendido.
Desejava tanto certo desejo que não existia ser humano, desumano, vil ou bondoso que não o soubesse. Não escondia de ninguém os desejos pensados ao apagar as velas de aniversário ou quando por ventura se deparava com raras estrelas cadentes.
Aquele homem queria ser reencontrado.
Perdeu-se em labirintos desconhecidos, errou os erros que todos erramos, mas decidiu se esconder para não ser atormentado pela ideia do que poderia ter sido mas ainda não foi.
Contudo, o pobre homem sonhava. E não havia saída quanto a isso: o sonho vem, a vigília chega, e lá está o homem com um bloco de anotações para desvendar anagramas e símbolos que o solstício da cegueira o concedia por compaixão.
Tinha uma filha. Não a via desde muito e queria que ela compreendesse que a vida não é fácil, não é justa, não é o final de um romance romântico. Mas não podia explicar-lhe todas essas coisas, pois há quarenta anos não se encontraram.
Apenas pressentia o seu nascimento tardio e portanto já escolhia com exatidão o que a ela seria ensinado, o papel de pai que executaria com destreza assim que nascesse, pois sua missão era a de ser bom pai.
Até sua chegada, adormecia na esperança do encontro com a chave. Ao despertar, o bloco de notas, no qual rabiscava as memórias oníricas que os anjos - ou seus estímulos mentais - permitiam-no recordar.
Nos dias naturais, ouvia Beatles e gostava de moquecas de camarão. Apreciava casinhas com varandas delicadas, onde se sentava em cadeiras artesanais que havia ali para observar o pôr do sol. Era leal com seus amigos e família. Colecionava ímãs de geladeira dos países por onde passou. Amava um cão, esse que também não tinha nascido. Mas pressentia a sua chegada.
Aquele homem queria ser reencontrado.
Era um sujeito estranho, mas não pouco atraente. Gostava de dançar quando não observado: Foxtrot, Gene Kelly, Frank Sinatra, entre outros ritmos e estrelas de nomes conhecidos.
Desejava saltar de paraquedas. Em muitos de seus sonhos, via-se caminhando nu pelas avenidas onde morara ou caindo de precipícios acordando em seguida como se por susto retornasse abruptamente ao próprio corpo. Então, tomava o bloco de notas nas mãos e interpretava cada nova visão, cada rosto desconhecido, como se fosse o prenúncio de um novo solstício. Aquele homem seria reencontrado em breve, mas não poderia sabê-lo ou o medo o afastaria do próprio destino. Dessa maneira, preferia a dúvida inconsciente à certeza de que por mais estranho que fosse, era igual a todos nós: pobre homem humano e esperançoso, máquina desejante e feitor de suas estradas. Certo dia, reconheceram-no na rua: assustou-se mas sorriu. Sua missão se completou. Rasgou o bloco de notas e curou-se do olho avermelhado, retomando a visão que nunca fora perdida de fato. Ele a inventou. Enxergou de perto a filha, o cão, os vizinhos, os transeuntes, as árvores que adornavam o centro da cidade. Voltou a dançar nos salões do bairro, onde conheceu sua primeira e única esposa. Não custou muito para que suas premonições se realizassem: com o passar dos anos, já reencontrado, deixou o sonho e escolheu a vida. Conformado, aceitou a felicidade, mas nunca saltou de paraquedas: Também sofria de acrofobia.
Há tempos, uma de minhas primeiras professoras de Ballet clássico, pessoa que somente na idade adulta aprendi a admirar e que certamente não acessa o Sofia, ensinou-me um segredo. Ensaiávamos uma coreografia Russa para um festival, na qual tinha eu de realizar uma sequência de sapateado com outras duas bailarinas. Severa, pediu-me que fizesse tal parte coreográfica sozinha enquanto todos me observavam.
Senti medo vivo e ela o reconheceu, claramente como seus olhos azuis. Contrariando minhas expectativas, apenas disse-me:
- Respira e vai.
E fui. Acho que foi a melhor sequência realizada de uma vida toda, em se tratando daquela montagem a qual tinha certa dificuldade (fui bailarina clássica durante quatorze anos e meio, desde os quatro anos, além de algumas aulas avulsas até o ano passado; um pouco de jazz, seis meses de dança contemporânea e, já mais velha, seis meses de dança de rua, mas sempre fui exageradamente clássica e por isso me inveja tanto os quadradinhos e rebolados da Anitta, de quem sou fã e admito sem receios).
Durante muitas situações na vida, lembrava-me daquela frase, o "respira e vai". E em todas elas fui, às vezes acertando, n'outras errando sem querer e, ainda, em algumas, errando por falta de opções.
Mas hoje é um dia especial: o segundo de 2018 e sinto o mesmo medo-tão-vivo. Daqui para sempre, uma sucessão de acontecimentos terão início e modificarão a minha vida. Precisarei encará-los sozinha, no máximo com a torcida daqueles que me amam. Mas serei eu. Do aeroporto até o que virá depois, pelos próximos meses e talvez anos.
Estou com medo.
Respiro e vou?
Desaprendi a coragem?
Ou será desculpa para abraços e consolos?
Boa noite!
Poema
Ney Matogrosso
Eu hoje tive um pesadelo e levantei atento, a tempo
Eu acordei com medo e procurei no escuro
Alguém com seu carinho e lembrei de um tempo
Porque o passado me traz uma lembrança
Do tempo que eu era criança
E o medo era motivo de choro
Desculpa pra um abraço ou um consolo
Hoje eu acordei com medo mas não chorei
Nem reclamei abrigo
Do escuro eu via um infinito sem presente
Passado ou futuro
Senti um abraço forte, já não era medo
Era uma coisa sua que ficou em mim
De repente a gente vê que perdeu
Ou está perdendo alguma coisa
Morna e ingênua
Que vai ficando no caminho
Que é escuro e frio mas também bonito
Porque é iluminado
Pela beleza do que aconteceu
Há minutos atrás
Eu hoje tive um pesadelo e levantei atento, a tempo
Eu acordei com medo e procurei no escuro
Alguém com seu carinho e lembrei de um tempo
Porque o passado me traz uma lembrança
Do tempo que eu era criança
E o medo era motivo de choro
Desculpa pra um abraço ou um consolo
Hoje eu acordei com medo mas não chorei
Nem reclamei abrigo
Do escuro eu via um infinito sem presente
Passado ou futuro
Senti um abraço forte, já não era medo
Era uma coisa sua que ficou em mim, que não tem fim