[...] Mas agora quero lhes dizer uma coisa: a jabuticaba é fruta de se comer, mesmo que não se tenha dentes.
Meio com medo, as aves pegaram com o bico as jabuticabas. E com o mesmo bico estalaram essas frutinhas. O barulho era assim: plique-ti, plique-ti, plique-ti.
Acharam a jabuticaba uma maravilha. Embora tivesse no fundo um azedozinho. Como você sabe, a jabuticaba tem um caroço que é doce e depois de chupado um pouco azedo.
[...]
Mas acontece uma coisa: as aves ficaram com o caroço das jabuticabas na boca e não sabiam o que fazer.
Perguntaram então a Odisséia e Ouvídio:
- Devemos engolir ou não engolir o caroço?
Ouvídio e Odisséia ficaram bobos:
Não sabiam o que responder. Pensaram em pedir ajuda a Oxalá, mas acharam que já tinham pedido muito e que tinham que se arranjar sozinhos.
(LISPECTOR, CLARICE. Quase de verdade].
Querido leitor,
Às vezes não nos damos conta de que os melhores dias das nossas vidas podem ser simplesmente como pequenas jabuticabas: simples, doce-azedas, efêmeras, mas muito saborosas.
Acabei de chegar da minha primeira aula em campo do meu estágio supervisionado de Língua Portuguesa. A sensação que trago comigo é tão boa, tão feliz, que não só me ajuda a olhar com mais doçura para outras “áreas” da minha vida, mas também me faz constuir algumas certezas:
- Eu quero mesmo e preciso ser professora;
- Os adolescentes continuam engraçados e esquisitos, como os da minha época;
- As pessoas, no fundo, deixam que o azedo de suas escolhas se sobreponha ao doce que de fato sentem, apenas por terem noção de que a vida não passa de uma jabuticabeira....
Cheguei tímida, acompanhada pela professora substituta Salete. Pessoa muito interessante: meiga, criativa, terna – deve ser uma boa mãe e uma boa vizinha para se ter como amiga. Lá chegando, surpreendi-me ao descobrir que a atividade do dia era nada mais que um exercício sobre o gênero entrevista: entrevista com a estagiária Camila....(que na verdade é Amanda, leitores: mas Salete insiste em me chamar de Camila...certamente ela conheceu e odiou alguma Camila que muito lhe fez mal, quando ambas tinham apenas 12 anos....).
Sim caros leitores: eu fui entrevistada pelos alunos do meu estágio.
As perguntas foram: Qual o meu nome; Em qual universidade estudo; Qual a duração do meu curso; Como vejo a escola atualmente; Se eu pretendo exercer o magistério; e, por fim, como profissional das Letras, em qual outra área, além do magistério, gostaria de atuar.
Quando me foi perguntado o meu nome, um menino do tipo engraçadinho...(desses que a gente finge que detesta, mas na verdade amamos), ironizou:
- Como você é burra!!!!! Ela acabou de falar que se chama Amanda, e você ainda pergunta o nome dela!! Hahaha....
Acontece, leitor, que a professora Salete havia transcrito a proposta de entrevista numa folha, pedindo aos alunos que lessem as perguntas para mim.
- Como você é burra!!!!! Ela acabou de falar que se chama Amanda, e você ainda pergunta o nome dela!! Hahaha....
Acontece, leitor, que a professora Salete havia transcrito a proposta de entrevista numa folha, pedindo aos alunos que lessem as perguntas para mim.
A pobre menina não era burra; apenas fez o que lhe foi pedido.....
A verdade é que tão pouco a professora Salete e o menino engraçadinho são pessoas “burras”:
A verdade é que tão pouco a professora Salete e o menino engraçadinho são pessoas “burras”:
Mal sabem eles que a pergunta mais difícil de se responder, na minha opinião, é a de como me chamo.
- Qual o meu nome?
Amanda. Mas não é apenas Amanda...é Amanda Lopes de Freitas. Amanda que vem do latim “a que será amada”e do Tupi “chuva”; Lopes e Freitas que vêm de algum lugar distante, onde Portugueses,Índios, Negros e Espanhóis foram misturados num caldeirão histórico. Há que se lembrar da preposição "de": o meu Amanda Lopes pertence a um Freitas, que os registra e completa sintaticamente. Sem contar os apelidos, carinhosos ou não, ao longo da vida: Corujinha, Nega-preta da mamãe, Vaca-véia, Gorda-baleia-saco-de-areia, Chicote, Hanson, Capitu, Ximboquinha, Amandão, Irmã, Irmãzinha, Amandex, Ô Capeta, Moreninha, Mandinha, Meu bem, Meu pote de ouro, Minha lactobacila, Minha Capivara, Minha namorada-monstro, Dona Amanda, chata, chatinha, Bruxa do 71, Frida Kahlo, Serena, Amandinha...Camila.
Ou seja: nunca saberei o meu verdadeiro nome.
- Qual o meu nome?
Amanda. Mas não é apenas Amanda...é Amanda Lopes de Freitas. Amanda que vem do latim “a que será amada”e do Tupi “chuva”; Lopes e Freitas que vêm de algum lugar distante, onde Portugueses,Índios, Negros e Espanhóis foram misturados num caldeirão histórico. Há que se lembrar da preposição "de": o meu Amanda Lopes pertence a um Freitas, que os registra e completa sintaticamente. Sem contar os apelidos, carinhosos ou não, ao longo da vida: Corujinha, Nega-preta da mamãe, Vaca-véia, Gorda-baleia-saco-de-areia, Chicote, Hanson, Capitu, Ximboquinha, Amandão, Irmã, Irmãzinha, Amandex, Ô Capeta, Moreninha, Mandinha, Meu bem, Meu pote de ouro, Minha lactobacila, Minha Capivara, Minha namorada-monstro, Dona Amanda, chata, chatinha, Bruxa do 71, Frida Kahlo, Serena, Amandinha...Camila.
Ou seja: nunca saberei o meu verdadeiro nome.
Sei que meu ante-nome era Carolina, mas meus pais mudaram de idéia antes do meu registro...o que é uma pena, visto que Carolina se reduziria, com o tempo, a Carol. Talvez assim, pode ser que eu soubesse hoje quem eu sou com mais clareza.
Por fim, o foco foi invertido: pedi à professora que me deixasse entrevistar os meninos.
Fiz perguntas gerais, sobre televisão, música, cinema, escola...até vida amorosa...(sim leitores: eu não me contenho!! Saí do meu primeiro dia de estágio já aconselhando às meninas de 12 anos a prestarem mais atenção nos meninos feios que ficarão bonitos; e , explicando aos meninos de 12 anos que quando estes fizerem 24, sentir-se-ão extremamente atraído pelas meninas a quem hoje chamam de “mutantes”...(na minha época, gorda-baleia-saco-de- areia....).
Algumas respostas foram óbvias, porque a vida é meio óbvia leitor....
A: - Se pudesse fazer uma pergunta a L, uma só, qual seria?
Menina com inicial B: - Perguntaria se ela gosta e quer ficar com o menino R.....
Viés psicanalítico: B gosta de R, mas banca a melhor amiga de ambos porque sabe que, no fundo, R finge que detesta a menina L,mas na verdade é louco para ficar com ela, sem que B saiba.
A: - Qual a sua música preferida?
Menino tímido: - Não sei.....
(meia hora depois)
Menino tímido - Não tenho não fessora.
Viés psicanalítico: Certamente o menino tem uma música preferida; mas não sendo funk, nem hip hop, ficou com vergonha de contar aos amigos......
A – Qual o dia mais feliz da sua vida, até hoje?
Menino atencioso: - Quando fui à praia.
Viés psicanalítico: Quando ele foi à praia.
Estou num momento muito feliz da minha vida, transitando por todas as áreas do lecionar: Jovens universitários, jovens que hão de ingressar na universidade; crianças; um adolescente super sensível, e, agora, outros 18 pré-adolescentes hiper sensíveis. Sem contar a minha pesquisa, ainda vagarosa, mas que já tem me ajudado a construir um olhar de pesquisadora também em outras disciplinas e demais acontecimentos da vida pessoal.
Por fim, o foco foi invertido: pedi à professora que me deixasse entrevistar os meninos.
Fiz perguntas gerais, sobre televisão, música, cinema, escola...até vida amorosa...(sim leitores: eu não me contenho!! Saí do meu primeiro dia de estágio já aconselhando às meninas de 12 anos a prestarem mais atenção nos meninos feios que ficarão bonitos; e , explicando aos meninos de 12 anos que quando estes fizerem 24, sentir-se-ão extremamente atraído pelas meninas a quem hoje chamam de “mutantes”...(na minha época, gorda-baleia-saco-de- areia....).
Algumas respostas foram óbvias, porque a vida é meio óbvia leitor....
A: - Se pudesse fazer uma pergunta a L, uma só, qual seria?
Menina com inicial B: - Perguntaria se ela gosta e quer ficar com o menino R.....
Viés psicanalítico: B gosta de R, mas banca a melhor amiga de ambos porque sabe que, no fundo, R finge que detesta a menina L,mas na verdade é louco para ficar com ela, sem que B saiba.
A: - Qual a sua música preferida?
Menino tímido: - Não sei.....
(meia hora depois)
Menino tímido - Não tenho não fessora.
Viés psicanalítico: Certamente o menino tem uma música preferida; mas não sendo funk, nem hip hop, ficou com vergonha de contar aos amigos......
A – Qual o dia mais feliz da sua vida, até hoje?
Menino atencioso: - Quando fui à praia.
Viés psicanalítico: Quando ele foi à praia.
Estou num momento muito feliz da minha vida, transitando por todas as áreas do lecionar: Jovens universitários, jovens que hão de ingressar na universidade; crianças; um adolescente super sensível, e, agora, outros 18 pré-adolescentes hiper sensíveis. Sem contar a minha pesquisa, ainda vagarosa, mas que já tem me ajudado a construir um olhar de pesquisadora também em outras disciplinas e demais acontecimentos da vida pessoal.
O Orkut não me faz mais falta....quase.
Estou feliz, leitor.
Sei que há outras coisas para se resolver, outros azedinhos que virão...mas o doce, ainda que efêmero, faz a gente não se contentar com uma jabuticaba só, buscando outras jabuticabas, outros pés, outros pomares....e por aí vai.
Quanto ao caroço, leitor capcioso....
Estou feliz, leitor.
Sei que há outras coisas para se resolver, outros azedinhos que virão...mas o doce, ainda que efêmero, faz a gente não se contentar com uma jabuticaba só, buscando outras jabuticabas, outros pés, outros pomares....e por aí vai.
Quanto ao caroço, leitor capcioso....
Confesso que pergunto todos os dias a Oxalá o que devo fazer com ele...engolir ou não engolir?
A única coisa que Oxalá me diz é:
- Nega-preta-do-Pai: você vai ter que se arranjar sozinha....
que bom ler este texto, senti tanto amor nas suas palavras, fico feliz com vc.
ResponderExcluirbeijo