quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Memória a deslizar...

Mas novamente estúpido provei
Desse doce amargo, quando eu sei
Cada volta sua o que me faz
Vi todo o meu orgulho em sua mão
Deslizar, se espatifar no chão
Eu vi o meu amor tratado assim
Mas basta agora o que você me fez

Acabe com essa droga de uma vez
Não volte nunca mais pra mim

Do fundo do meu coração
Não volte nunca mais pra mim
(Do fundo do meu coração -Roberto Carlos).

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Há muitas coisas a minha espera, especialmente hoje. Além dos estudos para a prova de mestrado (motivo pelo qual voltei a fumar um maço de cigarros por dia, desses baratos...), há também outros tantos textos, outras tantas atividades. Viver é isso: movimentar-se...
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Há poucos dias, tive uma conversa que, não só me cortou o coração, como deu-me impulso para certas realizações pessoais: a total compreensão do que vem a ser o conceito de memória. Ao verificar rapidamente o site Wikipédia, pude encontrar tal definição: "...A memória é a capacidade de adquirir (aquisição), armazenar (consolidação) e recuperar (evocar) informações disponíveis, seja internamente, no cérebro (memória biológica), seja externamente, em dispositivos artificiais (memória artificial)." É fato que está em "alta" estudos sobre a Memória na Literatura, na verdade, não por modismo, mas por necessidade, porém isto é sopro para outro marear.
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Em "Memórias de Emília", tem-se um conceito de memória que transgride o que se tem de habitual, em termos de gênero: memória como mentirinha bem contada. Não será isso, Dr Caramujo?
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Vivemos situações que, quando trazidas à memória, evocam-nos sentimentos distintos do que quando se deu o efetivo fato, ou seja, o texto que a memória traz à tona, ainda que se remeta ao passado, é concebido no tempo presente, naquilo que hoje estou (...e não "sou"). No fim das contas, existem várias memórias a respeito de um dado fato, à mercê do tão somente agora.
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Escrevo estas linhas num preciso agora, ali-vi-a-dor.
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A cada conversa, a cada retomar, a memória do que foi ou não, modificar-se-á de acordo com os nossos interesses pessoais. Isso nos difere dos animais irracionais: a extraordinária possibilidade do recriar uma situação.
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Nada é eterno. Aprendi isso em meu penultimo relacionamento amoroso, e hoje, trazendo tais sofrimentos a minha memória, parece-me tão óbvio. Se houvesse eternidade, não haveria razão para o instante, o presente, as relações já se dariam por si só, como um fado. Havendo escolhas, sempre haverá fim...e isso, por incrível que pareça, não é de todo ruim, porque como se daria o novo, se o velho ainda estivesse lá, ocupando um espaço que não é mais seu?
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Apesar desta constatação, o que ainda me admira é a capacidade que temos de fazer mal às pessoas a quem amamos, pelo artifício da memória. Não falo aqui do mal não intencional, mas do mal que usamos para a nossa auto defesa....Afinal de contas, era ou não amor? Houve ou não paixão? De que tipo foi essa paixão? Foi apenas admiração mútua? Ou nada passou de uma amizade platônica, romantizada pela impossibilidade do concretizar? (...quando houve possibilidade, a memória nos confundiu...).
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Não gosto de perder. Mas chega um momento em que é preciso ver as pessoas tal qual elas são, sem idealizações trazidas pela memória, por um "Eu te amo" dito num momento de reencontro. Pessoas são o que são: também mesquinhas, também pequenas, medrosas, inseguras,...cheias de misérias.
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Se para Emília, a memória nada mais é que uma mentira bem contada ( e eu concordo), já o amor, insistente temática dos últimos posts, articula-se, a meu ver, em um movimento contrário:
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Uma verdade que não se "conta".
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Ama-se sem saber porquê. Ana Paula é uma mulher extraordinária, inteligentíssima, sexy, sensível, "humana"...quando me apaixonei por essa mulher, foram todos esses atrativos juntos, separados ou sincronizados que me fizeram querer essa mulher. Pedro é bem humorado, seguro, cheio de sí, carinhoso, amigo (embora deteste cães, eu amo cães)...e foi essa atração que fez com que, ao longo de alguns meses, eu encontrasse nesse homem uma grande paixão. Já o caso de Juliana e Renato seguiu um rumo diferente: paixão de carne, de fogo, dessas que dispensam explicações...hoje moramos juntos na Violeira, com nossos vinte e cinco filhotes de gatos. E dessa forma, as paixões, intensas, menos intensas, construídas ou das que se esbarram, nascem.
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Sobre as paixões: algumas vingam, outras não. Mas ainda assim, amor não é apenas isso. É aquilo que fica depois que a paixão se esvai....(a meu ver, certas paixões nunca se esvaem de fato, mas vão e voltam, como numa montanha russa). Amor não se explica, experimenta-se. Como uma comida saborosa cujos ingredientes não importam, mas sim o sabor que aquela combinação nos traz (ainda que haja beterrabas em meio às demais delíciazinhas; a gente releva certos defeitos).
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Então, o amor é eterno?
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Não. Talvez para alguns privilegiados, corajosos, sortudos, sim...mas para a maioria dos seres mortais, não. Ainda assim, quando uma paixão morre, embora a dor seja demasiadamente grande, o artifício da memória entra em cena transfigurando aquilo que foi ou não foi: "Ah...sabe de uma coisa? Pedro era muito ruim de cama...."; " Ana Paula? ah ela era sem sal...hoje percebo isso com mais clareza"; "Sabe...Juliana e eu foi uma coisa mais ....carnal, mas ela nunca seria a mãe dos meus filhos, sem contar que ela tinha uma mania que eu detestava...." - e por aí brotam nossas auto defesas, contra a dor de um término, mesmo os términos medíocres.
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Já quando "morre" o amor, não há memória que transfigure o que foi real. Morre-se por acidente, não por vontade. Morre-se por impossibilidade, e não por vaidade....dúvida, capricho: palavra des-dita.
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Amanhã até posso mudar de ideia, mas hoje, uma coisa se faz muito clara: Não "pretenda" amor, não diga o que não sente. Seja "eu te amo", ou "eu acho que te amo", ou " acho que você pode ser a mulher da minha vida". "Cala-te boca", como dizia uma vizinha....

A palavra, pelo menos pra mim, vale mais que um documento medonho assinado num cartório, em meio a pessoas que talvez nem desejem sua felicidade...Palavra é gesto. É o que no futuro fará da nossa memória isto ou aquilo: palavra é compromisso.
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Minha memória, já há tanto deslizar, é quem diz hoje, do fundo do meu coração:

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"Acabe com essa droga de uma vez
....e não volte nunca mais pra mim".


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