quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades

*Janela encantada. Caetana Paula
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Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades - disse nosso patrício Camões, para jamais ser esquecido. Ainda no campo da Litertatura, é das mãos do habilidoso Saramago que nasce Blimunda, mulher que reconhece as vontade das pessoas. Saca-lhes a vontade para que sirvam de combustível de uma passarola voadora. Penso que vontade é instrumento que nos leva ao voo: o que nos mantem os pés no chão é a vontade de voo, vontade de sonho. Só assim.
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Sou um pouco Blimunda também, percebo as vontades do outro. Já a minha vontade é névoa difícil de se enxergar, nasci em dia chuvoso, na cidade das nuvens. Hoje pensei nas minhas vontades e elas se multiplicaram, encheram a casa da alma de filhotinhos.
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Já houve o tempo em que vontade era sinônimo de cachoeira; o dia era longo e tão colorido a ponto de nos cegar a vista, passávamo-lo brincando, dia que não tinha fim. Minha vontade era a de vivier naquela casa, estar eternamente alí, eternamente condenada a uma tarde infinita de sol com meus primos e amigos. Um pouco mais velha, a vontade de shopping e cinema falou mais alto: optei, durante longo período, por dias mais curtos e cinzas, para logo em seguida - aos dezesseis - mudar outra vez de ideia. Queria ter estado aqui, se soubesse que duraria tão pouco - dos estrellas en el cielo. Hoje, opto por cinema, shopping e Lojas Americanas. Ninguém vive só de saudade.
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Já tive vontade de ser padre, missionária, beata; viver em alguma favela de São Paulo prestando serviço comunitário, ou em Moçambique, ao lado de amigos que lá estão. Vontade grande foi a de ser médica, ou psicologa hospitalar, somente para cruzar os corredores brancos (porque odeio psicólogos; gosto mesmo é de psiquiatra). Ainda tenho vontade de África, vontade de medicina, vontade de passar a vida em uma favela prestando serviço comunitário; há o que fica, em todo o caso, ainda que mude o formato.
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Jogadora de basquete, jornalista, bailarina, isto é, tudo me passou pela cabeça; durante cinco anos a certeza do jornalismo, para jogá-la por terra na primeira reprovação do vestibular. Passou. A vontade de dança sempre está: voltei a dançar essas semanas, matriculei-me nas aulas de Ballet. Acho que o fiz só para ter o prazer de faltá-las todas, visto que ao cair das 17:00 do dia, a única vontade que vem é a de dormir até as 21:15, Oi oi oi....
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Já pensei em casar na igreja - véu, grinalda e buquê - como manda o decoro. Houve o tempo em que deixaria "tudo" (embora nada tivesse...rs) por amor; em que estar ao lado da pessoa amada era metonimicamente o sentido da vida. Já desci aos infernos por amor, tantas e tantas vezes. Hoje, quero mesmo é ter um filho; nasci pra ser mãe, entre outras coisas. Adotar uma criança, ganhar meus R$7.000 por mês, como professora de Literatura de Língua Portuguesa em alguma univerisade do mundo (ou Português para estrangeiro) viver num lugar legal e fazer trabalho voluntário com meninos que caíram no crime. Adotar uma dessas crianças e ensiná-la a escrever e ler (sem dúvida as melhores coisas que minha mãe me ensinou). Ninguém vive só de flores-bombom-poema-chifre-DR-ex-distância-o c*r*lho.
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Vontade mesmo é essa que vem, arrebatadora, sem quando nem onde. Ontem senti vontade de aprender Francês; melhorar o Inglês e o Espanhol, conseguir proficiência nessas línguas, projeto para os próximos três anos.
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Antes dos 30, quero vontades novas. Outras bolhas de sabão.
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Vontade de que meus pais sejam felizes, dentro do que ainda lhes cabe, do que a vida não sugou. Vontade de que minha tia tenha a estabilidade que merece, estabilidade pela qual minha mãe luta sozinha. Vontade de que certas pessoas da minha família se f*.Vontade de que os caçulas sejam livres, que contem comigo pra tudo, que eu tenha, futuramente, grana e estabilidade pra que contem comigo pra tudo. Vontade de estar viva muito tempo para dizer a eles ...  "Olha, a mãe de vocês era maluquinha, mas a pessoa mais legal do mundo, juro por Deus". Vontade de milagre, às vezes ainda tenho.
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Sei que perde o tom, de quando em quando, mas o texto é confessional.
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Muda-se o ser, muda-se a confiança.
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Vontade de nada também dá, vontade de ficar quietinha, sem excessos. Mas a vida insiste em convocar, seja por meio do olhar ou da impaciência. Eu vivo de olhar e impaciência, não tem jeito.
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Por fim, vontade de chegar até o fim, só por curiosidade.
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[...]
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.

Continuamente vemos novidades,

Diferentes em tudo da esperança:
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem (se algum houve) as saudades.

O tempo cobre o chão de verde manto,

Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.

E afora este mudar-se cada dia,

Outra mudança faz de mor espanto,
Que não se muda já como soía.
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Queria aprender a nadar, mas o medo comeu a vontade.
Medo é cachorro grande que come a vontade, passarinho pequeno de canto-chatinho.
Bau-bau.

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