quinta-feira, 14 de julho de 2011

Antes que seja tarde

*Your umbrella. Foto de Miguel Afonso.
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"Olha, não sou daqui
me diga onde estou
não há tempo não há nada
que me faça ser quem sou
mas sem parar pra pensar
sigo estradas,sigo pistas pra me achar"
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Quando mudei-me de São Paulo para Viçosa tinha 18 anos. Lembro-me que meu aniversário de 19 anos, já em Viçosa, foi o pior de todos os da minha vida. Os motivos eram esses: eu não era daqui e não havia nada no mundo que podia fazer, naquele momento, tornar-me quem sou. Seguia algumas pistas para me achar, mas levou muito tempo para que isto acontecesse.
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Minha família é mineira, portanto, com a aposentadoria de meu pai fomos obrigados a vir para as bandas de cá. Primeiro, pelo custo de vida, mais acessível; segundo, para a realização dos sonhos de meus pais, que hoje avalio não terem dado muito certo: enquanto meu pai sonhava com uma vida tranquila, num sítio que ele mesmo construiria com seu esforço, dedicação e trabalho, minha mãe almejava estar mais perto de sua família, principalmente perto de sua mãe, Maria. Sete anos depois (olha que cabalístico), eis o resultado: meu pai, devido aos seus problemas de saúde, não conseguiu fazer emergir o sítio com o qual sonhara (mas chegou a comprá-lo), vendendo-o ainda neste mês (na verdade, trocando-o por um apartamento). Ultimamente, papai vive em casa tristonho, por vezes muito nervoso desde a venda deste sítio, a que coincidiu com a morte do seu terceiro grande amigo (nosso cachorro: meu pai é muito ligado a cachorros e sofre muito quando eles nos deixam), além de uma acentuação de seu problema cardíaco, arritmia cardíaca. Quanto a minha mãe, desde o falecimento de minha avó (a mãe dela), mamãe sempre chora pelos cantos, por vezes muito nervosa, visto que a ela ficou incubida toda parte burocrática que diz respeito à morte de minha avó, como por exemplo, reverter parte da aposentadoria de sua mãe para uma tia - uma das que mais amo - em função de um leve grau de deficiência mental desta, a que lhe impossibilita de levar uma vida totalmente normal (motivo de caos para todos nós, pois ela vive sozinha na casa que era de minha avó).
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Embora o importante seja a busca, como nos diz Guimarães Rosa, há sonhos que não se realizam como gostaríamos. Isto porque a vida não é assim tão doce; às vezes, ela é dificilmente, desnecessariamente amarga, na medida em que nos tornamos adultos.
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Sobre mim. Bem, eu tinha 18 anos. Meu "ficante-amigo-colorido" era mineiro (mantivemos um curtíssimo relacionamento à distância em 2003), porém ele faleceu vitimado por uma doença sanguínea. Este foi o primeiro motivo para eu não querer jamais mudar-me para Viçosa (porque na época em que pretendia fazê-lo, para estar junto dele, não houve condições). Em segundo lugar, a vida: meus amigos-irmãos, meu Ballet (acho que uma das partes mais importantes de mim, que de tão importante, apesar d'eu "gordita" e já velha, ele nunca me deixa, estou sempre bailando, seja no meu "eu" , no meu jeito não linear de escrita ou nas coisas que me ocorrem). Além disso, claro: meus trabalhos voluntários que tanto amava e os lugares que frequentava... enfim, minha Terra.
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Por fim, obrigada a mudar-me (eu não tinha como me sustentar sozinha na época e sou filha única), o pior que podia ter acontecido obviamente aconteceu: meu primo-irmão (fomos criados juntos, era meu melhor amigo, tanto no amor quanto na guerra) de apenas 16 anos morre. Já doente, recuperou-se por dois anos, porém, como estas coisas que não podemos, não sabemos explicar, assim que mudei-me para Minas, a fim de ficar perto dele, Cleiton fora obrigado a mudar-se para São Paulo, continuando seu tratamento lá, à espera de um transplante cardíaco. Através de um sonho (em função disto, apesar da minha admiração a Freud e à análise de sonhos psicanalítica, ainda preservo certas raízes poupulares), senti que Cleiton precisava de mim. Viajei para São Paulo e passamos a última semana de sua vida juntos.
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Fui a última pessoa a vê-lo com vida. Depois de seus pais, entrei no quarto onde ele estava, antes dos médicos começarem os procedimentos padrão, enquanto Cleiton já desacordado. Este fato é para mim motivo de orgulho, saber que sei lá o porquê, fui escolhida para acompanhá-lo, de certa forma, para a outra margem do rio.
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Com todos estes acontecimentos, não havia tempo, não havia nada que pudesse amenizar em mim esta carga de dor (a que veio a se manifestar somente dois anos depois, em uma crise aguda de Transtorno Bipolar que me acometeu em 2006).
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Mesmo assim, prossegui, por falta de escolha, mas prossegui.
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"nunca sei o que se passa
com as manias do lugar
porque sempre parto antes que comece a gostar
de ser igual, qualquer um
me sentir mais uma peça no final
cometendo um erro bobo, decimal"

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Nunca sei o que se passa com as manias do lugar. Penso que saí muito nova de São Paulo, quando estava por começar a vida. Chego a contar nos dedos quantas vezes fui a uma boate em São Paulo. Barzinhos? uma vez, apenas, mas eu ainda não sabia beber (e hoje sei? rsrs). Com passar do tempo, os primeiros amigos, também primos, Leandro e Patrícia, imprescindíveis para a restauração da minha felicidade (por isso os amo tanto, ainda que de um jeito muito peculiar) surgiram. Depois, ainda em 2005, a Pastoral da Juventude, responsável por inúmeras mudanças em minha vida, dentre elas, a chegada dos primeiros amigos, não primos, e do meu terceiro namorado, aquele com quem mantive um relacionamento mais longo.

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Em 2006 passo no vestibular da Universidade Federal de Viçosa: Letras. Enquanto todos os meus colegas de curso comemoravam,para mim era indiferente (engraçado...é como me sinto hoje), até certa tristeza me causava, porque meus amigos-primos não haviam passado na mesma época (mas seguiram seus caminhos posteriormente). Meu pai quis fazer um churrasco, cheio de pompas, para que comemorássemos. Não quis. Acreditava que "vencer" o vestibular não me passava de obrigação, visto que estudei em colégio particular ao longo de toda vida. No final das contas, ainda não me sentia uma peça de quebra-cabeça algum.

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"na verdade continuo sob a mesma condição
distraindo a verdade, enganando o coração"

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De acordo com a lei do eterno retorno, sete anos se passaram e hoje me sinto como naquele tempo, exatamente igual. Quando criança, tive um sonho seguido por uma sensação estranha, uma espécie de "tremor" como se estivesse me deslocando do corpo...(não sou espírita, mas é fato verídico). No sonho, uma pessoa muito estranha e desconhecida disse-me: "Você há de dar sete voltas pelo mundo, começando agora!". Ao dizer isto, com um estalar de dedos do sujeito, senti meu corpo girar. Não me recordo em que ano isto aconteceu...

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"pelas minhas trilhas você perde a direção
não há placa nem pessoas informando aonde vão
penso outra vez estou sem meus amigos
e retomo a porta aberta dos perigos"

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Tudo começou a mudar em 2005, como já disse. Namorei um homem fantástico, tive alguns ficantes muito legais até encontrar "O namorado", citado acima. Com o fim deste relacionamento em 2009, após o "luto", que durou cerca de um ano, digamos que ainda durante o luto consegui conciliá-lo com "a minha nova e feliz vida": 2009 foi, ao mesmo tempo, o melhor ano de todos! Conheci uma série de pessoas: dentre elas, amigos que se instalaram definitivamente em mim. Fui a TODAS as festas de Viçosa, além de bares (ao "meu" bar Leão, hoje em reforma, íamos de quarta à sexta). Aprendi a gostar mais da Amanda e a encontrar felicidade nas pequenas coisas. Um pouco antes de tais eventos, talvez 2008, dei-me conta de que Letras era de fato o meu curso. Foi quando então iniciei uma reviravolta em minha vida acadêmica, correndo atrás do prejuízo dos anos anteriores: tornei-me tutora, bolsista FAPEMIG, educadora de Literatura em dois cursinhos [sendo o Cursinho Popular do DCE o atual (?) ] e fiz uma monografia sobre o tema que sempre sonhei estudar: o diabo. Passei com uma nota medíocre? sim, passei, 80. Acho que merecia 90, mas tudo bem, vai passar.

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Talvez se tivesse analisado ... (Calma Amanda, sem stress, vou cortar o comentário).

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"na verdade continuo sob a mesma condição
distraindo a verdade, enganando o coração"

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Qual o meu objetivo com este texto? Além de escrevê-lo à 1:48 da madrugada ao som da linda música do Pato Fu "Antes que seja tarde", a idéia era exprimir um pouco da minha angústia. Agora que as coisas estavam caminhando, que havia felicidade no ir e vir, na vida e nos amigos, novamente retomo a porta aberta dos perigos, porta que só cabe a mim adentrar. Só.

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Estou cheia de dúvidas, cheia de dilemas e problemas. Vontade e necessidade de sair de casa, mas ultimamente tenho pensado muito em meu pai. Escolhas acadêmicas, profissionais, dias que não chegam! Não passam! Ainda não estou curtindo a formatura, da mesma forma que não curti, naquela época, ter passado no vestibular. Porque sou egoísta, quero tudo junto, tudo ao mesmo tempo, na minha mão, agora e sim: tenho medo de mudanças.

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Distraindo a verdade e enganando o coração, sigo. Minha vida amorosa está estável, mas uma estabilidade que advem da minha fraqueza e não daquilo que eu realmente gostaria [primeiro, ficar com "certo" compromisso; depois, namorar, para então, caso desse certo, juntar as escovas de dente, construir "uma vida" (uma vida: projetos que mesmo diferentes tentem uma aproximação, para que valha a pena estar junto, permanecer ao lado de quem se gosta) e, por fim, ter um filho]. Enfim: sete anos se passaram e eu, na verdade....

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"....continuo sob a mesma condição, distraindo a verdade, enganando o coração"

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Antes que seja tarde,

Boa madrugada!

(Pato Fu- Antes que Seja Tarde)

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