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- Pois eu sei! - gritou Emília. - Verdade é uma espécie de mentira bem pregada, das que ninguém desconfia. Só isso.
...
("Minhas" memórias - Monteiro Lobato).
AMOR FEINHO
"Eu quero amor feinho.
Amor feinho não olha um pro outro.
Uma vez encontrado, é igual fé,
não teologa mais.
Duro de forte, o amor feinho é magro, doido por sexo
e filhos tem os quantos haja.
Tudo que não fala, faz.
Planta beijo de três cores ao redor da casa
e saudade roxa e branca,
da comum e da dobrada.
Amor feinho é bom porque não fica velho.
Cuida do essencial; o que brilha nos olhos é o que é:
eu sou homem você é mulher.
Amor feinho não tem ilusão,
o que ele tem é esperança:
eu quero amor feinho."
(Adélia Prado)
"Eu não sei dizer
Nada por dizer
Então eu escuto
Se você disser
Tudo o que quiser
Então eu escuto
Fala
lá, lá, lá, lá, lá, lá. lá, lá, lá
Fala
Se eu não entender
Não vou responder
Então eu escuto
Eu só vou falar
Na hora de falar
Então eu escuto
Fala
lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá, lá
Fala"
(Fala - Secos e Molhados)
"...Mantenho o passo alguém me vê
Nada acontece, não sei porque
Se eu não perdi nenhum detalhe
Onde foi que eu errei
Ainda encontro a fórmula do amor..."
....Deixa acontecer naturalmente
Eu não quero ver você chorar
Deixa que o amor encontre a gente
Nosso caso vai eternizar...(2x)
Você já disse que me quer
Prá toda a vida, eternidade
Quando está distante de mim
Fica louca de saudade...
Quem a razão do seu viver
Sou eu!
Está tudo bem, eu acredito
Eu não tô duvidando disso...
Só que eu tenho muito medo
De me apaixonar
Esse filme já passou
Na minha vida
E você tá me ajudando a superar
Eu não quero ser um mal
Na sua vida...
(Repete 345 vezes...)
....
De acordo com MELLO (2011), pode-se perceber que o discurso elaborado pelo grupo de pagode Revelação, composto por homens brasileiros heterossexuais, metonimicamente reinventa o homem pós moderno a partir de um comportamento padrão. Provavelmente, a faixa etária do homem em questão está situada entre 17 a 77 anos. Trata-se de um homem cuja preocupação central é o próprio umbigo: o quarto verso da primeira estrofe "...nosso caso vai eternizar" metaforicamente tenta convencer a parceira de que a força do amor selará a relação do casal, quando, de fato, temos uma antítese sintomática (ato falho) CASO versus ETERNIDADE, mostrando-nos que o homem exemplo não só teme os arranjos sociais "formais" (relação estável, namoro, casamento), como também pretende enrolar o máximo a parceira até que esta se convença de que é uma idiota e abandone a canoa (furada).
...
Pode-se perceber ainda a tentativa do homem em reverter o foco do discurso: ele se auto caracteriza como sofredor, enganado, encurralado pelas circunstâncias e projeta tal idealização na parceira, caracterizando-a como aquela cujo enorme coração lhe garantirá a paciência e tranquilidade necessária para que ele permaneça no núcleo "cafajeste" da sociedade , sem maiores cobranças. Implicitamente, o homem pós moderno atribui toda culpa disso a mulher "VOCÊ disse que me quer, VOCÊ fica louca de saudade, Já vi esse filme (isto é, já fui enrolado por OUTRA mais esperta que VOCÊ ).
...
Eximindo-se de qualquer responsabilidade enquanto "casal", ele ludibria a mulher (do primeiro ao último verso, em todas as 345 repetições), construindo um texto fraco do ponto de vista formal, apresentando inúmeras incoerências, clichês e tautologias, cuja mensagem final poderia se resumir em:
1) "Não quero ser um mal na sua vida" = Não quero compromisso.
2) "Nosso caso vai eternizar" = Não quero compromisso.
3) "Eu não quero ver você chorar" = Odeio ser cobrado e não quero compromisso.
4) "Deixa que o amor encontre a gente"= Não quero compromisso.
5) "E você tá me ajudando a superar" = Você é gostosa, mas não quero compromisso.
[...]I never thought you were a fool
But darling, look at you
You gotta stand up straight, carry your own weight
These tears are going nowhere, baby
You've got to get yourself together
You've got stuck in a moment and now you can't get out of it
Don't say that later will be better now you're stuck in a moment
And you can't get out of it
I will not forsake, the colors that you bring
But the nights you filled with fireworks
They left you with nothing
I am still enchanted by the light you brought to me
I listen through your ears, and through your eyes I can see...
(Stuck in a moment you can´t get out - U2)
O Grande Mestre e o Guardião dividiam a administração de um mosteiro zen. Certo dia, o Guardião morreu e foi preciso substituí-lo.
O Grande Mestre reuniu todos os discípulos para escolher quem teria a honra de trabalhar diretamente ao seu lado.
-Vou apresentar um problema – disse o Grande Mestre. – E aquele que o resolver primeiro, será o novo Guardião do templo.
Terminado o seu curtíssimo discurso, colocou um banquinho no centro da sala. Em cima estava um vaso de porcelana caríssimo, com uma rosa vermelha a enfeitá-lo.
-Eis o problema – disse o Grande Mestre.
Os discípulos contemplavam, perplexos, o que viam: os desenhos sofisticados e raros da porcelana, a frescura e a elegância da flor. O que representava aquilo? O que fazer? Qual seria o enigma?
Depois de alguns minutos, um dos discípulos levantou-se, olhou o mestre e os alunos a sua volta. Depois, caminhou resolutamente até o vaso, e atirou-o no chão, destruíndo-o.
-Você é o novo Guardião – disse o Grande Mestre para o aluno.
Assim que ele voltou ao seu lugar, explicou:
-Eu fui bem claro: disse que vocês estavam diante de um problema. Não importa quão belo e fascinante seja, um problema tem que ser eliminado.
“Um problema é um problema; pode ser um vaso de porcelana muito raro, um lindo amor que já não faz mais sentido, um caminho que precisa ser abandonado – mas que insistimos em percorrê-lo porque nos traz conforto”.
“Só existe uma maneira de lidar com um problema: atacando-o de frente”.
Nessas horas, não se pode ter piedade, nem ser tentado pelo lado fascinante que qualquer conflito carrega consigo”.