terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Quid est Veritas?

*Foto de Maria Flores. O peso do mundo às costas.
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Não sou espírita, embora comungue da filosofia kardecista em certos pontos. Tampouco umbandista ou adepta ao candomblé, apesar de que são estas as expressões mais interessantes que já presenciei. Falta-me a Sinagoga e a Mesquita. Quanto à Igreja Católica, nasci nesse meio e durante a juventude inseri-me em diversos projetos cujo eixo - Teologia Juvenil e política - ampliaram meus horizontes (Patoral da Juventude). A Sociedade São Vicente de Paulo fez-me desconstruir um mundo cor-de-rosa e chocar-me com uma realidade que, apesar de minha,  fez-se névoa  durante  anos. Redescobri minhas origens e parti para uma militância de mim para o outro (militância solitária, pois meu foco sempre esteve além...). A Comunidade Missionária de Vilarregia ajudou-me a compreender as minhas angústias....Também houve a CASFA, onde compreendi um desejo: trabalhar com/para jovens infratores. O IPJ e os trabalhos pastorais dos amigos BH-enses ensinaram-me a coisa na prática: acarinhar um jovem homicida tal qual filho. A base de tudo foi o Ballet clássico, o qual desorientou-me profundamente, estragando-me.... Fez-me assim a vida: metade Gabriela, metade Poliana. Antes houvesse aprendido judô ou qualquer arte marcial (Boxe?). 
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Nunca mais assisti a uma missa (por opção); mas gosto de meditar em igrejas e capelas vazias. O que me encanta na Igreja Católica são os rituais, o decoro, a arte. Meus olhos se fizeram distantes da prática teológica, mas o coração prendeu-se à estética....(não acaso, pesquiso Gil Vicente e o século XVI).
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Fim da introdução.
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Não me faço piedade. Quando olham a meu pai - cansado, magro, "sofrendo" - irrita-me a falta de sensibilidade alheia. Talvez, infelicidade compartilhada. Meu pai teve a vida mais afortunada que já conheci. O desafio da luta só enriquece seu espírito. Meu pai não é fraco, tampouco digno de piedade. Odeio vizinhos curiosos, ou pessoas que olham-no como se fosse um coitado. Coitados são aqueles que não tiveram sorte no viver (meu pai soube e sabe viver). Sinto pena (apenas) dos que passam fome, não tiveram oportunidades, estão reclusos num mundo limitado, como o da caverna de Platão. Meu pai não: casou-se, teve uma filha, viajou, conheceu o Rio, tem amigos sinceros, irmãos que, de tanto amor,  estressam-me (coisas a serem relevadas pelo bem que o fazem). Minha mãe é a mulher mais forte do mundo; a enfermeira. Eu, pseudo-médica, leio artigos relacionados todos os dias e dou-me conta do prazer sentido em aprender as diferenças entre divertículo e diverticuloses (embora prefira às doenças sanguíneas). 
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Voltando. Não sou espírita. Não pretendo vincular-me a grupo algum neste momento. Mas sinto dentro de mim uma absurda capacidade de empatia que me chega a ser patológica: Empatia patológica.
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Vejo um homem baleado e sofro por sua angústia  meses a fio, como se fosse (eu) a vítima. Chego a sentir as mesmas dores, um processo alucinógeno sem uso de drogas. É tão pretensioso o que vou dizer....Mas, como ninguém lê essa porcaria de Blog, a confissão me liberta: acho que sou capaz de sentir as dores e angústias alheias. Não por altruísmo; não! Pertenço ao grupo dos egoístas; ultimamente, só minha carreia me preocupa (no plano consciente). 
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Quando um amigo ("o especial") finalizava o processo de quimioterapias e radio, cheguei a vomitar muitas vezes, estando ambos separados por fronteiras estaduais. O irmão, capitei por sonho e fui a última a vê-lo com vida. Repito diariamente estas confissões a fim de encontrar um pouco de luz, quiçá resposta. 
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     Quid est Veritas?
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Há dias sem dormir; hoje, por exemplo, não fui às aulas do Mestrado porque - devido a insônia - só adormeci por volta das cinco da manhã e recusei-me acordar às sete. (cem anos de perdão). À tarde, uma ansiedade insuportável, acrescida de todo infortúnio intestinal consequente. Desisti da segunda aula também. Não consigo ler, concentrar-me; giro em torno das mesmas questões, sentido dores que não são minhas, porém escolhidas (eu escolho, elas me escolhem, não entendo muito bem).
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Penso em meu namorado. Antes de qualquer coisa, de que nosso relacionamento dê certo ou não, quero sua felicidade integral, a que neste momento está vinculada a um trabalho efetivo, estabilidade, tranquilidade. Isso me preocupa de tal forma como se fosse eu a "concurseira". Desejo sua realização profissional porque sei: a esfera acadêmica é o seu lugar. Preocupa-me o infortúnio de não ser agora a resolução da vida. Na falta de ajuda concreta, passo os dias em casa "matutando" e absorvendo a ansiedade que julgo ser a dele.
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Um mês e algumas perdas. Amigos que partiram para o lado de lá - precocemente: um tio, uma amiga, um colega de 25 anos. Quando durmo, só consigo pensar na dor desses passantes e de suas famílias. Absorvo-as todas e quiçá por falta de labor (ou graça de vida-particular) faço de tais dores (tão) pessoais, como se fosse mãe de trigêmeos.
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Penso no meu tio, no meu pai, na minha mãe. Na minha atual incapacidade financeira , não permitindo ajudá-los como devia. É como se houvesse dentro de mim uma melancia no estômago, um mundo nas costas e um espelho na alma. Tudo me toca, tudo me dói. Sinto-me cada vez mais cansada: falta-me energia vital.
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(Cabe o parêntese. Uma de minhas ex aluninhas, a mais brilhante, disse-me certa vez  ao observar minhas últimas doenças de pele: Profi, sua energia vital está baixa....)
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É como se tivesse uma capacidade estranha em conectar-me com o mundo e suas desgraças. Não preciso procurá-las. Todas me vêm e não por desejo: é isso o que nomeio de empatia patológica.
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ou simplesmente....medo da vida.
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Então nos chegam serafins enviados por Deus com seus dizeres remendados de fragmentos bíblicos (mal interpretados, porém sentidos com alma, o que já é alguma coisa....). "Para Deus nada é impossível....porque ele é o caminho, a verdade  e a vida". É quando me vem a falta de paciência e excesso de retórica e preciosismo. Vontade de listar as inúmeras coisas não controladas por Deus, senão pelo livre-arbítrio humano ou fatalidade casual. Intimamente, no silêncio obscuro do eu, pergunto-vos:
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       Quid est Veritas?
O mundo e suas virtuosas-verdades-variantes.

2 comentários:

  1. Eu sempre leio vc e partilho de suas dores, estou até com aquelas coisas de pele (também tenho, como te falei). Mas faço o seu caminho contrário: aproximo-me de Deus, ou de um grupo religioso que professa a fé nEle, Ele aquele que está na Bíblia. Até o não-controlado Ele conhece. De qualquer forma, ainda que descrente, que Ele abençõe seu namor, amém :)

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  2. mas eu confio. só que dele não depende a resolução do mundo, das coisas, da vida ou morte. beijo

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